A dada altura -- mais exactamente algures na página 152 -- C.E. escreve a seguinte frase: «La force meurtrière de l'oeuvre d'art.» Fico-me em silêncio durante muito tempo, pensando numa tradução possível da mesma ou, mais bem dito, na que me pudesse parecer a melhor das traduções impossíveis. C.E. foi um pensador demasiado inquieto para que das suas frases se possam arrancar traduções conclusivas, pelo que «A força assassina da obra de arte» me parece uma tradução demasiado óbvia e injusta, quer para o autor destas palavras, quer para o metabolismo identitário desse gigante assimétrico que é o conceito Arte. Por outro lado - e trabalhando particularmente a palavra meurtrière - em esta significando seteira [1], retraduzo-a livremente para fronteira. O resultado, no todo, soa-me o menos evidente e sinto, por momentos, que E. aprovaria: «O poder fronteiriço da obra de arte.» Poucas coisas na vida me parecem nada axiomáticas e tão inquietantes como o são as fronteiras, sejam estas físicas ou, e principalmente, as da interioridade do Homem e da Arte humana.