As pessoas comem, dormem, compram, amam, matam e fodem à mesma velocidade. Eis o tempo moderno. Dentro da cidade sou eu dentro de mim e todas as hipóteses do meu olhar sobre as coisas e sobre as pessoas, regra geral bloqueadas pela teoria dos vencedores, são infinitamente desmontadas pelo espectador total que sou eu, rendida à universalidade dos detalhes, à poiesis dos vencidos. Caminho na linha das ruas em câmara lenta, sozinha como o sol que nasce contra os muros da cidade, sozinha como os bairros verticais projectados para as pessoas pobres. Sou 2870 apartamentos iguais com milhares de pessoas diferentes no seu interior, milhares de pessoas diferentes que comem, dormem, compram, amam, matam e fodem à mesma velocidade. À minha passagem, ninguém se apercebe de que a minha imagem reflecte na cidade a potência extraordinária da deformação, e a cidade não passa de um projecto de demolição de mim mesma dentro de mim mesma. Estou só e tudo o que amo, amo, projecto e destruo sozinha tanto quanto me amo, projecto e me destruo sozinha.